terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Escolher a melhor parte...

Jesus entrou numa aldeia. E uma mulher, de nome Marta, recebeu-o em sua casa. Tinha ela uma irmã, chamada Maria, a qual, sentada aos pés do Senhor, escutava a sua palavra. Marta, porém, andava atarefada com muitos serviços; e, aproximando-se, disse: «Senhor, não te preocupa que a minha irmã me deixe sozinha a servir? Diz-lhe, pois, que me venha ajudar.» O Senhor respondeu-lhe: «Marta, Marta, andas inquieta e perturbada com muitas coisas; mas uma só é necessária. Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada.» (Jo 10, 38-42)
 
Ontem, conversando com alguns amigos acerca do Natal e da luta que sentimos entre o lado consumista e o lado espiritual da época, perguntávamo-nos por que é que nós, os católicos, não conseguíamos sair do olho deste furacão que nos arrasta cada ano… E, por mais que nos esforcemos por colocar cada coisa no seu lugar, a verdade é que as caixas embrulhadas de cores vivas a soterrar a árvore de natal, a mesa cheia de comida que muitas vezes nem sabemos bem do que é feita e a corrida pela roupa da moda para celebrar esta data com estilo são coisas que não colocamos em segundo plano.
Outro aspecto é a tónica que damos ao momento que celebramos. Celebramos a vinda do Filho de Deus, o Deus feito homem para que o homem possa ser como Deus, o desejado de todas as nações que por amor vem estabelecer uma relação de Aliança com o homem, ou celebramos simplesmente uma festa da família, a paz no mundo e a harmonia sem nome? Pior que isso é reduzirmos o Natal à vinda do Pai Natal ou de uma qualquer Popota de supermercado… A verdade é que já muito poucos temos presente aquilo que, na realidade, se celebra no Natal… E os que temos, já não somos capazes de abdicar da febre global para ficarmos só com isso.
Este texto de São João, que cito no início deste post, fala por si. Por um lado a Marta inquieta e perturbada que não se detém à escuta de Jesus. Por outro, Maria, a quem nada inquieta a não serem as Suas palavras…
A Marta podemos ser nós que vivemos a correr para que tudo esteja pronto, bonito e saboroso, mas que no meio da azáfama corremos o risco de deixar escapar o essencial: o motivo de tanto trabalho. Maria, para o Senhor, foi quem escolheu a melhor parte, porque soube ao que devia deixar agarrar-se o seu coração. Maria seríamos nós sentados a contemplar o Jesus do presépio, sem nenhuma outra distracção.
O grande desafio para nós é sermos Maria sem deixarmos de ter o cuidado de Marta. A preparação da festa já é a festa. O importante é termos a correcta consciência do que celebramos. Não é normal celebrarmos conceitos, mas acontecimentos. Celebramos a VIDA, festejando na data em que alguém nasceu… Celebramos a FAMÍLIA ao festejarmos o momento em que determinada família concreta se constituiu… Celebramos a PAZ ao festejarmos um acontecimento que a produziu. Celebremos o NATAL como um acontecimento de salvação, em que Deus vem ao nosso encontro como Menino indefeso e todos os conceitos do que é verdadeiro, bom e belo terão nele o seu lugar.
Quantas vezes damos presentes sem saber a razão, queixando-nos da falta de dinheiro, da falta de merecimento de quem vai receber, da certeza de que não seremos retribuídos com algo tão bom, ou escolhido com tanto cuidado? Quantas vezes se estraga o Natal por causa destas coisas? Quantas vezes damos ou recebemos um presente de Natal e não o damos com a alegria que devia ser própria de quem dá ou recebe presentes?
Porquê? Porque não sabemos o que celebramos. Não temos outro motivo para dar presentes, a não ser receber presentes?…
Todos os anos me apetece furar o esquema da febre dos presentes. Não porque ache que não se podem dar - pelo contrário, o próprio Jesus os terá recebido de pastores e reis magos - mas os presentes que hoje damos roubam o lugar do Menino no coração de quem dá e no coração de quem recebe… Talvez se déssemos um presente a alguém como se o estivéssemos a dar a Jesus, e o recebêssemos como se o estivéssemos a receber de Jesus, o fizéssemos com mais gratuidade…
Porque o Menino de Belém fez-se dom gratuito, como todo o Amor, que só é verdadeiro se for dado como um presente de quem não espera nada em troca...

1 comentário:

  1. "Engraçada esta tua reflexão. O ano passado escrevi um texto idêntico (não tão inspirado).
    A minha experiência, como a de muitos, é a seguinte: todos os anos prometo a mim própria que me vou esquecer dos presentes e viver o Natal de coração. Faço planos para acompanhar as leituras nos domingos de Advento, para participar na reconciliação. Mas tens toda a razão: as Popotas distraiem! Este ano não enfeitámos a casa, não houve tempo (será?). O presépio ainda não foi tirado da caixa. Mas as prendas estão compradas. Simples, personalizadas e úteis, espero.

    A verdade, como dizes, é que é fácil ficarmos ansiosos com os preparativos para o Natal e cometermos excessos: é sempre um stress ir comprar o peru, os frutos secos, os chocolates...cá em casa acabam sempre por sobrar bolos! Os supermercados estão apinhados de gente e só conseguimos sentir-nos irritados com a multidão de formiguinhas a percorrer corredores. Esquecemo-nos que nada disso (o peru, os chocolates, os frutos secos…) é importante. O motivo por que celebramos parece ficar sempre em segundo plano. É triste. E todos os anos prometemos que vamos fazer o possível para no ano seguinte ser diferente. Melhor. Por isso, só peço para ser um bocadinho mais como Maria.

    A missa do galo é garantida mas contemplar o presépio em silêncio (lembro-me de uma conversa que tivemos sobre o silêncio...) não é tarefa fácil.”

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